13 maio, 2023

Infelizmente, Los Hermanos é bom

No começo de maio de 2023 o Ventura do Los Hermanos fez 20 anos, e este é considerado por muita gente não só como o melhor álbum da banda, mas também como um dos melhores discos do pop rock brasileiro, da MPB.

Reescutei todos os álbuns com muita atenção e carinho, pois, infelizmente, adoro Los Hermanos. Poderia ser só nostalgia, mas a música deles realmente conversa e se insere no contexto onde foram criadas e até hoje são relevantes, quiçá tem alguns aspectos que até mais interessantes de se reparar agora com distância do hype.

O primeiro disco, de 1999, é do que hoje menos gosto, mas ao mesmo tempo é o que me provoca mais nostalgia, tenho lembranças de o ouvir em fita cassete, algumas das músicas foram das primeiras que aprendi a tocar no violão e fazer versão diferente da original, lembro bem também da aventura e glória que foi ter descoberto o B side "Bom dia". Esse álbum tem uma coisa muito legal que não se repete mais nos outros que é o Camelo e o Amarante cantando juntos, harmonizando, isso só acontece de novo em "Flor" do Bloco do eu sozinho, e mui brevemente. Tem até aquele baixista gritando "chora" em "Pierrot", lembro que muita gente gostava. Não gosto dos timbres de guitarra deste disco, acho que ninguém gosta, o repertório tem bons momentos, mas uma das melhores qualidades é ser curto, por isso acerta bastante, não satura.

O Bloco do eu sozinho é, ainda, meu álbum favorito, não só do Los Hermanos, mas um dos que mais gosto dentre todos os que já ouvi em minha vida. Óbvio que tem muita nostalgia, aquela potência de ter adolescido o ouvindo e me deixando influenciar demais por esse disco. Considero o momento mais criativo da banda, mais dinâmico, livre, experimental. O Ventura ganha com alguns textos incríveis, e o 4 nos timbres de guitarra, mas o repertório do Bloco, a música, é indiscutivelmente diferente. Este álbum de 2001 é muito variado, tem bastante rock, guitarras saturadas e distorcidas, até um momento com pegada hard core em "Tão sozinho"; tem a balada em 6/8 com guitarras sujas tipo Weezer em "Casa pré fabricada"; "Mais uma canção" tem arranjo para violões, escaleta, e uma estética geral que não se repete na discografia deles; "Deixa estar" é simplesmente um momento brilhante na composição do Marcelo Camelo, até o arranjo dos metais é legal; tem clássicos que se tornaram quase clichês como "Sentimental" e "Veja bem, meu bem"; e o arranjo, a harmonia e modulações de "Adeus você" são coisas lindas e difíceis de se ouvir no pop rock de qualquer lugar.

Não me levem a mal, eu gosto do Ventura, mas desde a primeira música ele já me incomoda um pouco, ainda mais agora que já ouvimos a Mallu Magalhães defender o direito de brancos comporem samba - faltou convidar pro manifesto Noel Rosa, Chico Buarque, Zininho -, mas eu sempre senti que "Samba a dois" tinha, ao mesmo tempo uma pegada irônica, porque, definitivamente, não é convencionalmente um samba. Ao mesmo tempo, Ventura tem momentos emocionantes, principalmente da parte do Amarante. A começar pela guitarra dele, que tá com um timbre maravilhoso e com uma firmeza impressionante, os riffs que ele conseguiu desenvolver nesse álbum são invejáveis, ótimos pra referência e estudo. Agora, "Do sétimo andar", "Deixa o verão" são momentos muito delicados, de uma sensibilidade monstruosa, eu nem gosto de ouvir muito a história do cachorrinho perdido porque me entope a garganta da alma de afetos, e a música do casal preguiçoso só melhora com o tempo, amadurece com a gente, cresce com nosso amor; "Um par" também é bastante sensível, mas não gosto da reflexão do texto. Acho que no final das contas eu não gosto muito do Camelo no Ventura, acho que em "O pouco que sobrou" a gente tem um bom exemplo de como ele compõe e desenvolve o motivo melódico, mas algumas muito populares do disco, "O Vencedor", "Cara estranho" e "De onde vem a calma" me incomodam, me parecem ingênuas, os temas também não me apetecem, o que salva essas gravações são as guitarras do Amarante.

Algo que acontece em todos os álbuns que é importante comentar e pode não ser o que define as composições, mas com certeza define a estética da obra da Los Hermanos, são as baterias precisas, marcantes e autênticas do Barba, e os teclados tímidos mas expressivos do Bruno Medina. Gosto mais do 4 do que do Ventura, todas as qualidades da banda brilham nesse álbum, as composições, guitarras, textos, até os arranjos dos metais, que em todos os álbuns costumam ter frases legais, conversar bem com os temas e serem memoráveis, apesar de também um pouco desinteressantes, com muito uníssono, pouco contraponto e pouca harmonização, neste último álbum de estúdio da banda preenchem com mais cores e tensões intrincadas as poucas músicas em que aparecem. Mas as estrelas que caravterizam esta constelação são bateria e teclado. Desde a firmeza do piano logo na introdução, com a maciez, discrição e pulso da batida, até a esteira frouxa da caixa da bateria, tudo é um charme tão grande que ofusca outras bandas contemporâneas. A dinâmica dos arranjos de cada canção e a dinâmica total do disco, tudo se move de forma tão harmoniosa que faz até a gente suportar aquela chatice do "Horizonte Distante". Eu gostaria de dizer que as músicas do Camelo estão melhores do que as do Amarante no 4, mas seria absolutamente apenas um gosto muito pessoal, mas a questão é que o namorado da Mallu Magalhães estava insipiradíssimo nesta temporada, seus violões caíram super bem também.

Os ao vivo eu não recomendo, acho que é só pra fã da banda, os arranjos dos metais às vezes estão melhor trabalhados, mas os vocalistas não cantam bem e as captações não conseguem timbrar as guitarras. Já fui em uns 5 ou 6 shows da banda, inclusive num Planeta Atlântida, noutro que fez um estabelecimento chamado Fios & Formas despencar, lembro também de outros 2 no teatro do CIC. Mas os discos devem ser escutados, principalmente por quem diz gostar de música popular brasileira. Aquele que escuta muita bossa nova, artistas e arranjadores cabulosos como Tom Jobim, Tom Zé, Marcos Valle, ou ainda Caetano, Gil, Novos Baianos, ou até coisa talvez ainda mais sinistra como Hermeto Paschoal e Arthur Verocai, pode achar Los Hermanos ingênuo. E é, mas Los Hermanos põe a música brasileira pra antropofagizar o rock nos anos 1990, com todos os seus defeitos, inclusive o caráter informal e autodidata, no entanto ainda do jeito como a arte brasileira deve fazer. O Ventura também foi um dos grandes vazamentos da internet brasileira, eu até estranhei quando saiu o álbum oficial, de tanto que ouvi o leak, o scene. Lembremos também que "Anna Julia" foi a última música que o George Harrisson gravou. Precisava? Não. Mas pros músicos cariocas é uma honra e tanto.

03 maio, 2023

Cereja Azul - 2033

"2033" é o EP lançado em junho de 2022 pelo artista Lui. Neste trabalho, Lui se esforça para produzir música e criar algo novo, mesmo diante das adversidades dos anos anteriores. O EP apresenta diversas faixas, incluindo a composição instrumental "sdds d td + nd", que foi especialmente criada para refletir e sublimar a pandemia de COVID-19. Além disso, o setlist conta com um arranjo para violão e 3 vozes da bossa nova "Num Cantinho Qualquer", de autoria do avô do artista, Zininho. O EP também inclui duas parcerias com Arthur Brotto, "Ain't Never Ever Gonna Stop" e "Thiasus", ambas com uma pegada pop, mantendo a estética característica da Cereja Azul.